"Comece fazendo o que é necessário, depois o que é possível, e
de repente você estará fazendo o impossível."
São Francisco de Assis



quinta-feira, 28 de julho de 2011

A Notícia

Suzana acompanhava o noticiário da TV com pesar. Uma jovem mãe de família, com trinta anos fora vítima de um assalto na última terça-feira, dia 15 de janeiro, quando saía do mercado.

Por um motivo torpe, besta até, o assaltante, um jovem menor de idade, depois de apropriar-se dos objetos de valor, acertou um tiro a queima roupa, deixando a mulher desfalecida.

O socorro não demorou em levá-la ao hospital, aonde chegou desacordada, era o que a repórter dizia com voz abafada, lamentando por mais um caso de violência na cidade.

Nauseada diante de tamanha tragédia, Suzana afastou-se do aparelho de TV fixo em uma parede branca em algum lugar desconhecido, caminhou deixando suas pernas a levarem aonde quisessem.

Passou por corredores vazios e agourentos, muitas portas fechadas e poucas janelas abertas, até que chegou.

Em um quarto que contava com a porta semi-aberta, ela entrou e viu aquela mulher do assalto deitada em uma maca, aparentemente morta, ao seu lado uma senhora segurava sua mão com os olhos marejados.

Suzana, minha Suzana, como puderam fazer isso com você minha filha? Era o que a senhora dizia alisando a mão da mulher que jazia inconsciente.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Lançamento de Livro


O lançamento da antologia da qual faço parte juntamente com Miguel Sanches Neto, Isabel Furini e outros autores será no dia 26/07, a partir das 19h00, no Palacete dos Leões na Avenida João Gualberto 530, em Curitiba.
A entrada será franca.
Quem desejar receber um convite é só enviar e mail para elaynesampaio@yahoo.com.br

segunda-feira, 11 de abril de 2011

A Espera

A Jovem Ana soltou a faca com a qual picava tomates no quiosque de praia para observar o homem de caminhar cansado que mais uma vez se aproximava das pedras para sentar e observar o fim de tarde.

Aquela rotina já havia sido notada por ela que há seis meses trabalhava no local e presenciava diariamente aquela cena em que o senhor com seus setenta anos caminhava lentamente pela areia, parecendo desfrutar a brisa com regozijo.

Intrigada decidiu naquela tarde se aproximar e puxar assunto. Sentiu-se um tanto desconfortável com a expressão do homem que não era de satisfação e sim de agonia, aflição.

- Boa tarde, aproximou-se.

- Boa tarde minha jovem. – Os últimos raios de sol refletiram nos cabelos brancos do homem.

- Sou a Ana do quiosque.

- Prazer Ana, sou o Luiz. – Ele sorriu um sorriso triste, melancólico.

Como se a conversa não deslanchasse, ela, na afoiteza da juventude, já foi logo extravasando a curiosidade. – Por que o senhor vem até esse lugar, todos os dias, no mesmo horário, fazendo sol ou chovendo?

- Estou esperando uma pessoa.

- Há mais de seis meses? – O sorriso que se soltou de seus lábios era lindo, porém desagradável para Luiz, que do alto da sabedoria dos seus muitos anos de vida, percebeu um contorno debochado.

- Muito mais do que isso...

- Por que o senhor faz isso? Essa pessoa não vai aparecer. – As ondas colidiram contra as pedras liberando uma cortina úmida e refrescante, afastando Ana de seu ceticismo.

- Eu sei, mas mesmo assim eu espero.

Luiz lamentou a falta de esperança da moça tão jovem e já sem perspectiva e contou sua história, sem pressa, apenas saboreando cada nuance vivida e experimentada diante daquele entardecer onde o sol brilhava como um holofote aceso no céu laranja.

- Há mais de quarenta anos conheci Isabel aqui nesse mesmo lugar. – Começou ele, passando a mãe suavemente sobre a superfície áspera da pedra. – Ela era linda, não foi difícil nos apaixonarmos e consequentemente, nos casarmos. Formamos uma família linda, com duas filhas amorosas, que hoje já nos deram netos.

- É essa Isabel que o senhor espera?

Luiz não respondeu, fitou o horizonte acompanhando o vôo gracioso de um pássaro e continuou a história como se não tivesse ouvido à pergunta. - Durante muitos anos esse foi nosso local predileto, nós nos encontrávamos aqui todo final de tarde, para apreciar o poente em silêncio, apenas curtindo um a presença do outro e os encantos da natureza, da nossa juventude e da nossa vida perfeita.

- O que aconteceu para que o senhor começasse a vir aqui sozinho, sem ela?

Luiz não gostava de expor a esposa com quem tinha tido tantos momentos de alegria durante uma vida plena de realizações. – Nós vivemos juntos por mais de trinta e oito anos, ela a esposa perfeita, amorosa, boa mãe, dedicada dona de casa e eu o marido fiel e trabalhador.

- Isso parece ótimo.

- E foi ótimo, até que há quatro anos Isabel começou a esquecer das coisas, a tomar atitudes estranhas e a não reconhecer mais as pessoas.

Luiz notou a descrença nos olhos da moça, dando lugar ao espanto. - O que aconteceu com ela?

- Fizemos todos os exames existentes, tudo o que pudemos para recuperá-la, mas já era tarde, ela estava em um estágio avançado de Alzheimer. – Ana fingiu não notar o embargo na voz do homem, mas o visível sofrimento dele a fez engolir em seco. – Quando iniciamos o tratamento, a memória dela já estava bastante afetada.

- Sinto muito. – A moça sentiu uma dor incomum ao engolir a própria saliva.

- Os problemas aumentaram e não tivemos mais como mantê-la conosco.

- O senhor a internou? – Ela sentiu uma náusea momentânea imaginando que a família de Isabel tivesse se livrado dela.

- Foi a única saída, então ela foi para uma clínica onde médicos e enfermeiros a acompanham diuturnamente. Nossas filhas a visitam todas as semanas e eu... – Luiz suspirou mais uma vez a brisa fresca, balançando a cabeça negativamente. – Eu a vejo todos os dias, todas as manhãs vou até a clínica, me apresento e converso com ela durante horas. Às vezes ela me dá atenção, às vezes não quer nem saber de mim e a maior parte das vezes parece nem me ver.

Ana estava confusa, por que alguém continuaria se esforçando tanto para fazer companhia a uma pessoa que sequer notava sua presença? - Ela nem sabe mais quem é o senhor. – Concluiu de forma dura.

Luiz encheu-se de orgulho pela esposa e respondeu - Mas eu sei quem ela é, e ela é a pessoa mais importante do mundo para mim, por isso continuo visitando e conversando com ela todas as manhãs e à tarde vindo para cá, na esperança de que ela possa se lembrar dos nossos momentos juntos aqui e possa aparecer, nem que seja para um último pôr do sol.

- O senhor sabe que isso não vai acontecer, ela não vai mais aparecer.

- Eu sei, mas ainda assim eu espero. – Os olhos marejados do homem comprimiram o coração de Ana dentro do peito. Observando-o mais de perto, pôde notar as feições abatidas de quem convive com a dor e o sofrimento por mais tempo do que deveria.

Ela estendeu sua mão para ele, no afã de oferecer consolo, mas Luiz sabia que quem precisava de consolo não era ele e sim a jovem moça bonita e sem esperança, sem uma história para viver.

Ele a abraçou, quando o sol já não os fazia mais companhia. – Adeus. – Disse ele.

- O senhor vai voltar amanhã?

- E depois, até que minhas pernas não me permitam mais essa caminhada.

Ana ficara comovida com aquela história de amor, e entendera que o fim daquela espera significaria o desaparecimento dos momentos até ali vividos por Luiz e Isabel. - Quando esse dia chegar, - Ana falou sem afobação. - o senhor me chama que eu o ajudo a chegar até aqui para esperar sua Isabel.

Luiz sabia que Isabel não apareceria, ela jamais se lembraria dos entardeceres que passaram juntos, mas estava feliz e realizado, tinha tido a chance de mostrar àquela jovem que um amor de uma vida não termina, ele se transforma...